O protagonismo branco no Oscar

“Esse momento é muito maior que eu […] É para todas as mulheres de cor que agora têm uma chance porque esta porta foi aberta nesta noite.” Essas palavras foram ditas por Halle Berry em 2002, quando ganhou o Oscar de melhor atriz por sua interpretação em Monster’s Ball. A atriz foi a primeira, e até hoje a única, mulher negra a conquistar a estatueta nessa categoria.

Minha ideia era escrever esse texto após a cerimônia do Oscar, já que é a última e a principal premiação de cinema mundial. Porém nessa segunda-feira (13/01) saiu os indicados de cada categoria, e depois de ver a lista não é preciso esperar tanto para falar sobre a temporada de premiações do cinema. Dentre as principais categorias da premiação, apenas uma profissional negra foi indicada: Cynthia Erivo, por seu papel em Harriet, um filme conta a história de Harriet Tubman, uma escrava que se tornou abolicionista. Porém Cynthia não está entre os nomes mais cotados para vencer a categoria, segundo os críticos especializados (não preciso nem falar a cor da pele desses críticos né?). Outra produção negra que está concorrendo é o curta-metragem animado Hair Love, que conta a história de um pai negro lidando com a missão de cuidas do cabelo de sua filha. É com esse curta emocionante que temos a esperança de ver algum negro no palco recebendo a estatueta.

O curta Hair Love está disponível para assistir no Youtube

Mas a grande surpresa da lista de indicados, foram os não indicados. Começando por Jeniffer Lopez, que faz uma das melhores atuações da sua carreira em As Golpistas, a atriz e cantora estava cotada para entrar na disputa de atriz coadjuvante. O filme US, de Jordan Peele, não entrou em nenhuma categoria, contrariando as expectativas, principalmente pela atuação dupla de Lupita Nyong’o (que já ganhou o Oscar de melhor atriz coadjuvante por seu papel em 12 anos de escravidão, onde ela interpreta uma escrava). Lupita foi aclamada pela crítica logo após o lançamento do longa, era a escolha preferida do público e venceu a maioria dos prêmios que disputou por essa atuação. Outro injustiçado nesse Oscar foi “Meu Nome é Dolemite!“, que teve o retorno de  Eddie Murphy para o cinema, que não recebeu nenhuma indicação. Se não fosse pelo filme sul-coreano Parasita, que teve 6 indicaçõs (incluindo melhor filme), o Oscar 2020 seria 100% branco.

Depois de uma rápida passagem pela premiação desse ano, vamos ao principal fato desse texto: o Oscar (além das outras principais premiações) sempre foi branca, então porque estamos tão chocados nesse ano? A primeira edição do Oscar aconteceu em 1929 (Asas, ganhou como o melhor filme), desde então apenas 6 diretores negros tiveram seus nomes indicados como melhor direção (spoiler: nenhum deles ganhou), que são: John Singleton, por Os Donos da Rua (1991); Lee Daniels, por Precious: Uma História de Esperança (2009); Steve McQueen, por 12 anos de Escravidão (2013); Barry Jenkins, por Moonlight (2016); Jordan Peele, por Corra! (2018); e Spike Lee, por Infiltrado na Klan (2019).

Halle Berry após ganhar o prêmio de melhor atriz em 2002

Se nenhum diretor negro ganhou o prêmio, alguns atores já conseguiram levar a estatueta para cada por melhor atuação. O primeiro foi Sidney Poitier, em 1963 por seu papel em Uma Voz nas Sombras. Depois deles alguns outros atores negros venceram essa categoria, como Denzel Washington em 2002 pelo filme Dia de treinamento, ou Forest Whitaker por O Último Rei da Escócia em 2006. Como já dito anteriormente, do lado feminino, apenas Halle Berry levou a estatueta na principal categoria de atuação.

Dado os fatos volto a minha pergunta: porque estamos tão chocados nesse ano? A resposta é simples: vínhamos em um movimento contrário. Nessa década o número de indicações e prêmios de profissionais negros no Oscar tinha sido maior que em qualquer outra década. Nos últimos anos filmes negros conseguiram levar prêmios importantes, começando por Moonlight, que ganhou melhor filme em 2017 (em um dos maiores plot twist da história da premiação). Em 2018 Jordan Peele levou para casa o prêmio de melhor roteiro pelo seu longa de estreia Corra!, e no ano passado, 2019, depois de anos de carreira, Spike Lee venceu o oscar de melhor roteiro adaptado por Infiltrado na Klan. Porém, também vem de 2019 a imagem que melhor representa a identidade do Oscar: No palco recebendo o prêmio de melhor filme vimos incontáveis homens brancos, onde um deles segurava a estatueta e falava ao microfone que esse filme premiado era importante, pois era uma história sobre e que denunciava o racismo. O filme em questão é Green Book, dirigido por Peter Farrelly, o longa realmente fala sobre racismo, de uma forma irresponsável e que mais o prolifera que o denuncia. Foi com essa imagem que o Oscar nos mostrou que “acabou a cota de premiação de filmes negros e agora vão voltar ao normal”.

Vídeo da premiação de melhor filme em 2017

Talvez eu não precisasse escreve todo esse texto, poderia resumi-lo apenas em uma frase: por mais que o passado recente nos dê esperança, o Oscar nunca representou o cinema negro, e nunca representará!

Produção e elenco de Green Book recebendo o prêmio de melhor filme em 2019.
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